Já estava, há horas, envolvido em
pensamentos que o faziam um mero refém dos próprios sentimentos e não via mais
sentido em estar ali, inerte e aprisionado. Num súbito arroubo de paixão, levantou-se,
desceu as escadas, atravessou a cidade e foi ao encontro dela. Bateu à porta.
Eram batidas descompassadas, ora eufóricas, ora lentas. Ela, sonolenta, não
compreendeu se aquele barulho era real ou se estava sonhando. Ele insistiu nas
batidas, até que ela se deu conta do que estava acontecendo. Seu coração
acelerou, faltou-lhe ar e as mãos tremiam. Levantou-se, abriu a porta e lá
estava, diante dela, o céu. A imensidão daquele olhar transportou-a para a
parte mais elevada do universo, onde todas as coisas eram possíveis e toda a
doçura estava concentrada. Ela podia sentir, nos lábios, o gosto adocicado que
lhe fez menina durante muito tempo.
Olharam-se. Olharam-se bastante.
As mãos, apressadas, conseguiram se encontrar. Elas se tocavam, se apertavam e
se entrelaçavam, enquanto todas as outras partes daqueles corpos permaneciam em
silêncio. E, assim,
ficaram por muito tempo, enquanto os corações se encorajavam a se deixarem
ouvir.
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